O que a Holanda, na Europa, e Beirute, no Líbano, têm a ver com o autismo? A relação está no livro “Longe da Árvore”, do jornalista Andrew Solomon: enquanto uma mãe de uma criança deficiente definiu sua experiência como se tivesse descoberto que estava na Holanda em vez da Itália, como planejara, uma mãe de autista descreveu a sua própria experiência de criar o filho especial como se tivesse sido bruscamente jogada numa zona de guerra.
“Welcome to Holland” (“Bem vindo à Holanda”) é um texto de autoria de Emily Kingsley, que descreve a deficiência como um lugar bonito, cheio de serenas alegrias, mas diferente da maternidade que ela planejara: a Itália de seus sonhos.
Em contrapartida, a mãe da criança autista tem dificuldade para encontrar alegrias serenas em meio aos sintomas extremos de seu filho: capacidade de passar muitos dias sem dormir, aliada à incapacidade de se conectar ou falar com outro ser humano – inclusive a própria mãe. Some-se a isso os atos de violência aleatória que seu filho costuma cometer a sua hiperatividade, e não será difícil entender por que essa mãe comparou sua experiência com a maternidade a uma guerra.
O autismo é acompanhado por uma série de frustrações, e talvez a maior delas seja o fato de que não é possível prever o que torna um tratamento eficaz em um autista e totalmente ineficaz em outro. Infelizmente, a única maneira de descobrir a eficácia de um tratamento é experimentá-lo, geralmente por muito tempo.
O jornalista descreve o caso de uma menina diagnosticada com autismo que, após inúmeras intervenções, como fonoaudioterapia, terapia ocupacional, fisioterapia e musicoterapia, continuava sem dormir, causando feridas em si mesma e sem conectar-se com outras pessoas. Um neurologista falou aos pais, sem rodeios, que se ela havia reagido a toda aquela intervenção precoce e de qualidade, nunca iria falar.
Não foi, no entanto o que aconteceu nos anos seguintes: em ocasiões diferentes a menina falou frases inteiras e com sentido, identificando corretamente cores de objetos e manifestando vontades. Infelizmente, os pais não conseguiram identificar o que fizera com que ela falasse naquelas situações. Essa mãe acredita que o ato de falar, para sua filha, é como um congestionamento de trânsito: em determinados momentos, as ruas e avenidas ficam totalmente desimpedidas, e as palavras conseguem então chegar à boca.
Essa mesma mãe encontrou, no decorrer dos anos, suas próprias alegrias serenas na experiência da maternidade: um dia, ao se despedir da filha, a menina esfregou o próprio rosto no seu. Uma profissional que acompanhava a menina vibrou com a reação da menina, e a mãe soube que ela jamais fizera isso com nenhuma outra pessoa. Era o primeiro beijo que recebia de sua filha autista.
Texto escrito por Silvana Schultze, do blog www.meunomenai.com
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